O menino que sonhou ser artista

Cristiano Mullins – “Um dia sem risos é um dia perdido! Não tem esse texto!”
Por Geovane Gomes

Excêntrico e bem humorado, assim é Cristiano Mullins. Multifacetado, ele não se limita a atuar, canta e tampouco pintar, a profissão dele é ser artista. O dom para a arte parece correr no sangue da família. Cristiano decidiu seguir carreira no teatro quando seus grandes olhos viram seu irmão, Daniel Mullins, interpretando. Nesse momento não teve mais jeito, a arte roubou Cristiano para si. Um homem que se despiu até dos próprios preconceitos para viver outras vidas, outras personagens. Broadway? Que nada… Cristiano é adepto ao teatro produzido no Estado, e não sonha mais alto do que aquilo que o palco possa lhe dar. Confira no bate papo abaixo:
Nome completo: Cristiano Mullins.
Nascido em: Goiânia.
Profissão: Artista.
Formação acadêmica: Licenciatura em Artes Cênicas – Universidade Federal de Goiás (UFG).
Cristiano, como você descobriu a paixão pela arte? E a partir de que momento você percebeu que poderia viver e lucrar com esta profissão?
Sempre tive contato com a arte, mas isso se intensificou na adolescência por influência do meu irmão, Daniel Mullins. Ao assistí-lo no palco do Teatro Goiânia com o espetáculo “Show do Apagador”, ao lado de nomes como Eduardo Kauê e Sérgio Bandolla, fiquei fascinado com o artista que fazia humor com um talento admirável. A tranquilidade que ele passava no palco era inacreditável. Apaixonado, decidi que queria ser artista naquele exato momento e comecei a investir na carreira, e depois de anos se tornou minha profissão. Eu não consigo viver sem o teatro e me sinto um privilegiado em sobreviver dele. Tenho meu irmão como a maior referência na comédia e herdei o seu humor. Lucrei todos os anos que me dediquei à arte em absorver conhecimentos e experiências que, com certeza, me faz um ser humano cada dia melhor.
O ator precisa se despir de alguns preconceitos. Você é do tipo de artista que chama atenção pela excentricidade. Existe algum limite quando você está em cena? Já recusou a fazer alguma peça por ir contra os seus ideais?
Preconceitos! Ufa! Até dos próprios. Com muito respeito pela classe teatral, até mesmo porque estou inserido nela, vejo que os atores possuem mais preconceitos do que os artistas de outros gêneros da arte, digo isso porque percebo ao longo do tempo no cenário goiano. Acho engraçado! Preconceitos são para serem desconstruídos e o teatro nos permite refletir e eliminá-los, não me importa o que acham neste sentido e, sim, os sentidos. Mesmo na ausência de limite há de se ter limite. No entanto, me limitei a não participar de montagens teatrais porque não me tocaram enquanto artista.
Você já foi do drama a comédia. Qual o personagem que mais exigiu de você? Por que?
O juiz Hoffer, personagem da peça “A Visita da Velha Senhora”, do dramaturgo suíço Friedrich Dürrenmatt. Peça dirigida pelo diretor Sandro de Lima em 1999. Tínhamos em média 17 atores em cena, nomes importantes do cenário teatral goiano. Para mim foi mais que um desafio trabalhar com artistas que eu já admirava e havia assistido em outros espetáculos. Era necessário construir um personagem denso, mas com poucos e precisos movimentos presente nas cenas, e sem falas na maioria delas. Era o oposto do que eu sempre encenei. O Hoffer tinha 80 anos e eu ainda era um jovem com 27. Foram sete meses de ensaios e muito estudo para realizar o espetáculo.
Antes de encarar um personagem é preciso conhecer o mundo dele. Como você realiza o laboratório para construir um personagem?
A vivência contribui para compor o personagem. É fato que precisamos pesquisar sobre o texto, o autor e demais pontos ligados ao contexto da história para saber o universo da personagem. Cada espetáculo e sua linguagem exigem trabalhos diferenciados para sua construção. Difícil dar exemplos, mas eles podem surgir de experimentações, provocações, ou até mesmo intuições. Todos os exemplos são tentativas diárias que experimento nos ensaios e no palco.
Existe algum personagem que ainda gostaria de interpretar, mas não teve a oportunidade?
Vários! Um deles é O Giro, personagem da peça “O Abajur Lilás”, do dramaturgo Plínio Marcos. O primeiro texto teatral que tive contato. Eu não teria limites mesmo. E outro é o Imperador da peça o “Arquiteto e o Imperador da Assíria”, do dramaturgo espanhol Fernando Arrabal – Teatro da crueldade.
Nesses mais de 20 anos de carreira com certeza já viveu momento inesquecíveis. Qual a situação inesperada que mais te marcou no palco? Talvez um momento constrangedor ou um imprevisto?
Fico feliz quando imprevistos acontecem (RÁ RÁ RÁ RÁ). É teatro. Não teria como enumerar tantos imprevistos ocorridos e socorridos nos palcos e na vida real (RÁ RÁ RÁ RÁ). Recordo de uma cena que tive que saltar de um esplendor que descia pelos urdimentos do teatro Nacional, em Brasília, e a vara central (suporte) corria o risco de rasgar o ciclorama ( fundo branco). Então tive que saltar a seis metros de altura nos braços de um jovem ator, que por sorte era um musculoso atleta. Ele percebeu o alerta e me aparou sem interromper a cena. Eu estava com os olhos esbugalhados, transpirava frio, mas a concentração era enorme e tudo deu certo. Não vou citar o espetáculo para não comprometer a qualidade técnica da Companhia, porque foi um imprevisto daqueles que ninguém sabe e de onde surge.
Qual (ou quais) o sonho que você ainda não realizou?
Meu maior sonho é viver com intensidade e isso eu faço. Enquanto eu tiver vida estarei sonhando.
Qual o maior desafio para quem pretende viver de teatro em Goiás?
Ter coragem e exercitar a paciência.
Os grandes espetáculos de teatro circulam pelo eixo Rio-São Paulo. Para você o que ainda falta para Goiás começar a conquistar esse espaço nacional?
Temos excelentes montagens de espetáculos goianos que circulam pelo Brasil, além de talentos e capacidade para exercer nosso ofício. Não ficamos atrás de maneira alguma para outros estados. O que falta é um maior incentivo do poder público. Não podemos deixar que seja um desafio de projetos particulares de grupos. Mas antes de conquistar qualquer espaço que seja, precisamos nos organizar e ter olhos para nossos artistas, oferecendo condições dignas para atendê-los em todos os sentidos necessários para se fazer arte. Estão achando que ser ARTISTA é bagunça?
Quem é o Cristiano Mullins no dia a dia fora dos palcos? Estilos? Gostos?
Inclassificável.
Em poucas palavras fale sobre:
Família: Márcia, minha SUPER MÃE.
Teatro: Constrói o ser humano.
Medo: Morte.
Dinheiro: Desigualdade social.
Para terminar, qual a frase está presente na vida de Cristiano Mullins?
Um dia sem risos é um dia perdido! Não tem esse texto!

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