Os cuidados paliativos, ou paliativismo, visam melhorar a qualidade de vida de pacientes que apresentam uma doença grave. O termo ganhou destaque com a morte do jogador Pelé, que recebeu o diagnóstico de câncer de cólon em 2021 e estava internado desde o dia 29 de novembro de 2022 sob as cautelas do método. Ele faleceu um mês depois, deixando o mundo do futebol em luto. De acordo com a Organização Pan-Americana da Saúde (OPAS), o método alivia a dor em mais de 90% dos pacientes com câncer.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) aponta que “os cuidados paliativos são aplicáveis no início do curso da doença, em conjunto com outras terapias destinadas a prolongar a vida”. A entidade destaca que, a cada ano, cerca de 56,8 milhões de pessoas, incluindo 25,7 milhões no último ano de vida, necessitam do conjunto de práticas que englobam o termo. Ainda segundo a OMS, apenas cerca de 14% das pessoas no mundo que precisam do paliativismo, recebem atualmente.
A cirurgiã oncológica e coordenadora de cuidados paliativos Cláudia Naylor, da Sociedade Brasileira de Cirurgia Oncológica (SBCO), diz que há uma limitação de pesquisas sobre o momento do encaminhamento para cuidados paliativos especializados quando um paciente é diagnosticado com algum tipo de câncer: “No caso da Oncologia, infelizmente o mais comum é que o cuidado paliativo ocorra quando a doença se torna progressiva, depois de terapia de primeira e segunda linha ou quando o paciente passa por grave sofrimento físico, psicológico ou espiritual”, afirma.
A integração entre cuidados paliativos e o tratamento com intenção curativa é vital, visto que os pacientes e suas famílias geralmente se defrontam com cuidados prestados por vários profissionais diferentes, de várias especialidades, e em diferentes ambientes: “A melhor qualidade de vida possível é o principal objetivo dos cuidados paliativos e o gerenciamento ideal de sintomas é o meio para alcançá-la”, explica.
Mitos associados aos cuidados paliativos
Cuidados paliativos significam todos os tratamentos direcionados a pacientes cuja doença não responde mais a nenhuma intervenção farmacológica ou cirúrgica. No entanto, a falta de conhecimento dos profissionais de saúde e população em geral sobre o assunto está associada a mitos e equívocos, que levam a baixos índices de encaminhamento e mau uso desses serviços.
Dessa forma, pacientes com doença avançada recebem muito tarde no curso da doença, provavelmente devido ao medo e à desinformação. Prova disso é uma das metas da Union for International Cancer Control (UICC) até 2025: dissipar mitos e equívocos sobre a doença e reduzir o estigma associado ao paliativismo, garantindo a melhoria da qualidade de vida dos pacientes e familiares.
Cuidados paliativos em tratamento curativo x tratamento oncológico
A integração do Cuidado Paliativo Precoce (CPP) é um processo complexo que geralmente abrange ambientes comunitários, incluindo relações sociais e de trabalho, e institucionais com planos de cuidados centrados no paciente, ou seja, em seu “momento” tanto no tratamento quanto na doença.
É necessário haver flexibilidade, pois alguns pacientes precisarão se mover entre diferentes níveis de cuidados ao longo da trajetória da doença. A abordagem paliativa vai depender do status funcional do paciente e de sua carga de sintomas:
- Paciente relativamente estável com carga de sintomas limitada pode requerer apenas um nível de vinculação com os CPP, com a maior parte de seus cuidados sendo administrados por sua equipe de atendimento habitual;
- Paciente com doença avançada que apresenta uma carga de sintomas além do escopo de sua equipe de cuidados habituais pode se beneficiar de cuidados coordenados por equipe especializada em cuidados paliativos;
- E paciente no final da vida com carga grave de sintomas se beneficiará de serviços totalmente integrados, seja em ambiente hospitalar ou em seu domicílio, para os cuidados finais.
- Quadro de terminalidade de um paciente oncológico
Na fase de terminalidade, a maioria dos pacientes com câncer avançado experimenta uma deterioração progressiva em seu estado funcional global, ocorrendo um aumento da carga de sintomas nesses últimos meses/semanas de vida, geralmente associado a um declínio concomitante na função respiratória, em seu estado nutricional e mesmo na cognição, às vezes precipitado por complicações agudas que requerem visitas recorrentes ao pronto-socorro e eventuais hospitalizações, quando não há uma abordagem adequada dos sintomas.
Por sua vez, o reconhecimento da fase terminal da doença facilita o planejamento dos cuidados de fim de vida; prepara a família, paciente e cuidadores; envolve discussões sobre preferências como local da morte e questões quanto ao controle de sintomas. Mas é necessário enfatizar que o reconhecimento tardio de que a morte está próxima geralmente resulta em gerenciamento inadequado dos sintomas e atendimento psicossocial muito abaixo do ideal.
Como acontecem os Cuidados Paliativos
A comunicação com os pacientes e suas famílias é fundamental na fase terminal, pois promove confiança entre eles e a equipe de saúde. Essa sensação, por parte de pacientes e cuidadores, de não serem abandonados contribui para o bem-estar e auxilia no enfrentamento da evolução da doença e do luto subsequente.
Cláudia Naylor explica que os pacientes variam em seu desejo de saber se estão chegando perto da morte. Nos casos em que eles preferem não ser informados, é de vital importância pedir permissão para falar com seus familiares. A discussão deve ser conduzida com sensibilidade, habilidade, paciência e empatia, todas habilidades treináveis. Essa comunicação bem realizada contribui para redução dos pedidos de intervenções médicas agressivas próximo à morte, assim como tende a diminuir a morbidade e o luto.
Os maiores temores, tanto de pacientes quanto seus familiares, são a dor não aliviada adequadamente, falta de ar e outros sintomas graves. Por isso, eles precisam ter certeza de que essas questões serão tratadas meticulosamente. Afinal, faz parte dos cuidados integrais manter o sentido de controle e dignidade do doente e sua família, e assim, preservar a esperança em uma morte sem sofrimento, possivelmente evitável.