Monarquia do proletariado

Quando o economista, cientista social e pensador alemão Karl Marx escreveu “O Capital”, consolidando o conceito do socialismo científico e da chamada ditadura do proletariado, com certeza lhe ocorreram as dificuldades práticas a serem enfrentadas para a transformação radical da economia e do processo político. A história demonstrou que a preocupação era pertinente.
Por outro lado, jamais deve ter passado, nem de longe, pela cabeça do ilustre germânico, que sua tese pudesse inspirar algo tão distorcido em termos de modelo político-econômico quanto o atual regime da Coreia do Norte. Trata-se, a rigor, de um híbrido de socialismo com um regime monárquico-ditatorial. É uma sociedade bipolarizada, na qual se socializam os ganhos da frágil economia entre a casta militar e se distribuem as carências entre o restante da população.
É algo que poderia ser denominado de “Monarquia doProletariado”, já que a dinastia dos Kim Jong acaba de empossar seu terceiro “monarca” consecutivamente. Kim Jong-un, filho de Kim Jong-il, herda um “reino” com 24 milhões de habitantes, dos quais 1,2 milhão de pessoas são militares. As Forças Armadas têm um papel central no país, que dispõe de bomba atômica. Ao mesmo tempo, há informações de que a fome alastra-se, assim como dificuldades de acesso à saúde.
A pergunta inevitável é: até quando esses países como a Coreia do Norte, considerando o exemplo da inusitada “Primavera Árabe”, conseguirão conter a explosão social de sua população mais necessitada? Esta é uma questão que se coloca até mesmo para a China, onde, a despeito dos avanços nos últimos anos, mais de um bilhão de pessoas ainda estão muito distantes da sociedade de consumo moderníssima que se observa nos noticiários da TV e no mundo corporativo.
Os exemplos práticos do mundo socialista foram mais do que didáticos para demonstrar a inviabilidade da sustentação de economias baseadas numa pretensa sociedade igualitária e integralmente estatizadas. Como se observou na União Soviética, os meios de produção chegaram a um ponto de estrangulamento irreversível. No entanto, Marx continua com plena razão em um aspecto crucial: as desigualdades têm limites!
Não é possível manter indefinidamente, mesmo que pela força, populações inteiras sem direitos políticos plenos, sem liberdade de expressão, reprimidas pelo medo e alijadas de um acesso mínimo a bens de consumo reservados a uma elite política, militar ou burocrática. Por isso, os direitos têm de ser iguais, e o moderno capitalismo democrático deve buscar, sim, a socialização das oportunidades, por meio de empregos e salários dignos, saúde, educação e inclusão socioeconômica, como se tem observado paulatinamente no Brasil.
Neste século, no qual as mais rígidas e intransponíveis ditaduras têm sucumbido à consciência popular, como no mundo árabe, será cada vez menos provável a sustentabilidade de regimes totalitários como a norte-coreana “Monarquia do Proletariado”.
*Antoninho Marmo Trevisan é o presidente da Trevisan Escola de Negócios e membro do CDES-Conselho de Desenvolvimento Econômico e Social da Presidência da República.

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